Entenda a situação em Chipre, a nova vítima da crise europeia.


No momento em que o cenário econômico europeu parecia ao menos se estabilizar e caminhar para o início de uma recuperação financeira, surgem novos temores de um colapso do sistema bancário e de uma fuga generalizada de capitais. O mais recente foco de intoxicação vem da porção oriental do mediterrâneo, de uma economia de apenas 17 bilhões de euros, cujo endividamento público alcança a marca dos 145% do PIB. A parte sul da pequena e dividida ilha de Chipre integra a Zona do Euro e sobrevive apenas às custas do setor de turismo e de suas reservas de gás. Até pouco tempo, uma flexível regulação fiscal criava ali um paraíso para investidores da Rússia, o que ajudava a bancar os custos do Estado. Mas as incertezas sobre o bloco europeu fizeram o crédito russo desaparecer e mergulharam o país na falência. O risco de um confisco sobre os depósitos dos correntistas cipriotas apenas agravou ainda mais a situação. 
O primeiro pedido de socorro não é novo. Em junho de 2012, Chipre tornou-se o quinto de 17 países da Zona do Euro a urgir ao consórcio formado pela Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o FMI (chamado de troika), um fundo de resgate capaz de produzir liquidez dentro de suas maiores instituições financeiras. Tanto o Banco de Chipre quanto o Banco Popular de Chipre sofriam na ocasião os reflexos do colapso da economia grega: ambos eram donos de uma série de títulos públicos do governo helênico e foram obrigados a arcar com esses prejuízos. A resposta dos ministros das finanças da União Europeia surgiu apenas após nove meses. Liderados pelos alemães, concederam ao governo na madrugada do dia 16 um empréstimo no valor de 10 bilhões de euros, pouco mais da metade dos 17 bilhões necessários para ao menos contornar a crise.
Manifestante segura um cartaz que diz "Tirem as mãos do Chipre", em um protesto nas ruas da capital, Nicósia. O país está a beira de um colapso econômico (Foto: ASSOCIATED PRESS/AP)
Manifestante segura um cartaz que diz "Tirem as mãos do Chipre", em um protesto nas ruas da capital, Nicósia. O país está a beira de um colapso econômico (Foto: ASSOCIATED PRESS/AP).
Agora, o governo cipriota vive um dilema duplo. Precisa suprir os 7 bilhões de euros que ainda restam para liquidar (mesmo em caráter provisório) a dívida pública do país. Mas terá de cumprir as exigências da troika para a concessão do empréstimo. Os 10 bilhões de euros acordados só entrarão nas contas do governo de Chipre quando o país conseguir amealhar uma garantia de 5,8 bilhões de euros. A questão tramita com urgência no Parlamento. Segundo o porta-voz do governo, Christos Stylianides, “qualquer solução envolverá dor”.
Uma das propostas causou protestos generalizados na capital, Nicosia. O governo propôs arrecadar a garantia de 5,8 bilhões de euros a partir de confiscos sobre depósitos em conta corrente. Para montantes inferiores a 100 mil euros, 6,75% passariam a pertencer automaticamente ao governo. No caso de valores superiores, o confisco chegaria a 9,9%. "Todos devemos assumir nossa parcela de culpa”, tentou justificar Stylianides em um pronunciamento.
Autoridades da Rússia e do Chipre se encontraram nesta semana em Moscou para debater a possibilidade de abertura de uma nova linha de crédito. O pedido foi negado pelo governo de Vladimir Putin devido a um teto de endividamento imposto pela União Europeia a seus membros. Após uma reunião com seu colega cipriota, o ministro das Finanças da Rússia, Anton Siluanov, afirmou que os investidores de seu país não estão mais interessados nas reservas de gás de Chipre.
Economistas e analistas da imprensa europeia viram com bons olhos a concessão do empréstimo do Banco Central Europeu (BCE), mas criticaram a entrega desse valor diretamente ao governo. Para eles, isso cria um circulo vicioso de dívida, em que países fragilizados recebem o dinheiro do BCE e o repassam a bancos também fragilizados. O ideal seria analisar caso a caso e estabelecer critérios para que as próprias instituições financeiras tivessem acesso aos fundos do Mecanismo Europeu de Estabilidade.
Chipre pode se tornar a faísca de um bloco em grande efervescência política. A fuga radical de capitais dos bancos cipriotas pode contaminar outros países fragilizados, como Itália, Espanha e, é claro, Grécia. No século XVI, o abade de Saint-Pierre, um dos pais do ideal de integração da Europa, argumentava que a prosperidade geral do continente só seria possível a partir da paz entre as nações e de intensas trocas econômicas. A União Europeia mantém vivo o seu projeto, mas enfrenta agora mais uma ameaça à sua estabilidade econômica.
Fonte: Revista Época.

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