CHINA: “A ECONOMIA SOCIALISTA DE MERCADO" .
A China é hoje um país com dois sistemas econômicos: o
socialista, que resiste nas regiões mais distantes dos grandes centros e
sobretudo nas relações de propriedade - os meios de produção, em sua maioria,
permanecem nas mãos do Estado -, e o capitalista, que organiza cada vez mais as
relações de produção e de trabalho, sobretudo nas regiões mais modernas. Esses
dois modelos econômicos estão amalgamados por um sistema político próprio: a
ditadura do partido único, o Partido Comunista Chinês.
A economia chinesa foi a que mais cresceu
no mundo ao longo dos anos 1980 e 1990, enquanto a da União Soviética, seu
modelo inspirador, encolheu de maneira significativa. O país já é a segunda
economia do planeta, e o mercado mundial é invadido num ritmo crescente por
produtos made in China ("feitos na China"). Como explicar
claramente esses fatos? Para isso, é fundamental que se faça uma
retrospectiva, embora rápida, de sua história. .
Da China imperial à China comunista
A China é um país milenar. Ao longo de
séculos de história, alternou períodos de maior ou menor produção tecnológica,
cultural e artística: basta lembrar a pólvora e a bússola, ali desenvolvidas
durante a Idade Média européia, ou a Grande Muralha e as cerca de 7 000
estátuas dos guerreiros de Xi'an, construídas dois séculos antes da era cristã
e descobertas somente em 1974. Várias dinastias governaram a China, mas no
final do século XIX, sob o governo da dinastia Manchu, o império estava
decadente. A figura do imperador era apenas pro forma, decorativa,
porque naquela época o país fora partilhado entre várias potências
estrangeiras.
No início do século XX, sob a liderança de
um jovem médico chamado Sun Yat-sen, foi organizado um movimento nacionalista
hostil à dinastia Manchu e à dominação estrangeira. Esse movimento culminou em
uma revolução, em 1911, que atingiu as principais cidades do país. Tal
revolução pôs fim ao império e instaurou a república em 1912. Sob a direção de
Sun Yat-sen, foi organizado o Partido Nacionalista, o Kuomintang.
Apesar da proclamação da República, o país
continuava mergulhado no caos político, econômico e social. O poder permanecia
fragmentado. Muitas regiões estavam sob o controle de lideranças locais, os
chamados "senhores da guerra". Pequim controlava apenas uma pequena
parte do país, e mantinham-se os laços de dependência com as potências
estrangeiras.
Extremo Oriente Político.
Foi por aquela época que começou a se
desenvolver uma incipiente industrialização, com a chegada de capitais
estrangeiros interessados em aproveitar a mão-de-obra muito barata e a grande
disponibilidade de matérias-primas. Começaram a ser instaladas algumas fábricas
nas principais cidades do país, sobretudo em Xangai. No conjunto, porém, a
China continuava a ser um país de camponeses dominado por estrangeiros. A
tímida industrialização foi interrompida pela invasão e ocupação da China pelo
Japão, na década de 1930, e pela guerra civil, que se estendeu de 1927 até
1949. Entre os intelectuais chineses, desiludidos com a ideologia liberal, e
ante a impossibilidade de desenvolvimento dentro de um modelo capitalista
dependente, as idéias revolucionárias ganharam força. Além de receber
influência da Revolução Russa, essas idéias agora se juntavam ao sentimento
nacionalista e anticolonial que deu origem, em 1921, ao Partido Comunista
Chinês (PCC), do qual fazia parte, entre seus fundadores, Mao Tse-tung, seu
futuro líder.
Com a morte de Sun Yat-sen, em 1925, o
Kuomintang passou a ser controlado por Chiang Kaishek. Depois de uma curta
convivência pacífica, em 1927 o governo nacionalista colocou o PCC na
ilegalidade, iniciando uma guerra civil entre comunistas e nacionalistas que se
estenderia, com breves interrupções para combater os japoneses, até o fim da
década de 1940. Depois de unificar o país, em 1928, Chiang Kai-shek passou a
liderar o Governo Nacional da China com mão-de-ferro. Assim, na década de 1930,
paralelamente à ocupação japonesa na Manchúria (região onde se localiza Pequim,
atual capital chinesa, também conhecida por Beijing), o enfrentamento entre
comunistas e nacionalistas persistia. Em 1934, os japoneses implantaram na
Manchúria, com a conivência das potências ocidentais, o Manchukuo (Reino
Manchu), um país apenas formalmente independente, tendo como governante Pu Yi,
o último imperador chinês, que ficara aprisionado ainda criança na Cidade
Proibida desde a proclamação da República, em 1912. Pu Yi, porém, era um
imperador fantoche. Quem governava Manchukuo de fato eram os japoneses, que
tinham se apoderado de uma das regiões mais ricas em minérios e combustíveis
fósseis de toda a China.
Em 1937, os japoneses declararam guerra
total contra a China, atacando-a maciçamente. Chegaram a ocupar, próximo do fim
da Segunda Guerra Mundial, em 1945, cerca de dois terços do território chinês.
As cidades mais importantes do país estavam sob seu controle. Somente nesse
curto período houve um apaziguamento entre comunistas e nacionalistas,
empenhados em derrotar os invasores japoneses. Bastou, no entanto, que o Japão
assinasse sua rendição para que o conflito interno na China se agravasse.
Depois de 22 anos de guerra civil, com
breves interrupções, os comunistas do Exército de Libertação Popular, liderados
por Mao Tse-tung, saíram vitoriosos. Em outubro de 1949 foi proclamada a
República Popular da China. O país foi unificado sob o controle dos comunistas,
comandados por Mao, então secretário-geral do PCC: nascia a China Comunista. Os
membros do Kuomintang, comandados por Chiang Kai-shek, ao se refugiarem na Ilha
de Formosa, ali fundaram a República da China Nacionalista, também conhecida
como Taiwan.
A China comunista
A Revolução Chinesa de 1949 foi um grande
divisor de águas na história do país, e isso já ficara evidente quando Mao
Tse-tung, em discurso feito durante a proclamação da República, afirmou para
uma multidão em Pequim: "O povo chinês se levantou (...); ninguém nos
insultará novamente" .
Pelo menos no início, até mesmo por falta
de opção, a China revolucionária seguiu o modelo político-econômico vigente na
antiga União Soviética. Com base na ideologia marxista-leninista, implantou-se
um regime político centralizado sob o controle do Partido Comunista Chinês,
cujo líder máximo era o secretário-geral, Mao Tse-tung. Economicamente, como
resultado da coletivização das terras, implantaram-se de modo gradativo as
comunas populares, que seguiam, em linhas gerais, o modelo das fazendas
coletivas da União Soviética. O Estado passou a controlar também todas as
fábricas e recursos naturais. É oportuno lembrar que a Revolução Chinesa, de modo
diverso da Russa, foi essencialmente camponesa. Para se ter uma idéia, nessa
época havia na China em torno de 3,2 milhões de operários, o que equivalia a
apenas 0,6% da população (cerca de 540 milhões de habitantes). Assim, somente
após a revolução é que a China reiniciou seu conturbado processo de
industrialização.
O processo de industrialização
Seguindo o modelo soviético, inicialmente
o Estado chinês passou a planificar a economia. Em 1957, Mao Tse-tung lançou um
ambicioso plano, conhecido como o Grande Salto à Frente, que se estenderia até
1961. Esse plano pretendia queimar etapas na consolidação do socialismo por
meio da implantação de um parque industrial amplo e diversificado. Para tanto,
a China passou a priorizar investimentos na indústria de base, na indústria
bélica e em obras de infra-estrutura que sustentassem o processo de
industrialização. Apesar de dispor de numerosa mão-de-obra e de abundantes
recursos minerais e energéticos (veja a tabela abaixo), a industrialização
chinesa teve idas e vindas. O Grande Salto à Frente mostrou-se um grande
fracasso, desarticulando totalmente a economia industrial e agrícola do país.
A industrialização chinesa padeceu dos
mesmos males do modelo soviético: baixa produtividade, produção insuficiente,
baixa qualidade, concentração de capitais no setor armamentista, burocratização
etc.
Com o fracasso do Grande Salto, os
opositores de Mao Tse-tung dentro do Partido Comunista, liderados por Deng
Xiaoping, se fortaleceram. Para tentar reverter essa situação, Mao lançou o
movimento conhecido como Revolução Cultural (1966-1976), que agravou a crise
econômica do país e o enfrentamento político dentro do partido. Esse movimento,
além de tentar enfraquecer os burocratas do PCC, adversários de Mao Tse-tung,
buscava combater o modelo soviético que então imperava na economia chinesa. A
Revolução Cultural foi marcada por violenta perseguição aos supostos
contra-revolucionários e por isolamento econômico em relação ao exterior.
As divergências e as desconfianças entre
os líderes dos dois principais países socialistas aumentavam cada vez mais. Em
1964, a China detonou sua primeira bomba atômica e, três anos depois, a de
hidrogênio. A União Soviética, por sua vez, não admitia perder a hegemonia
nuclear no bloco socialista. Esse fato decisivo, somado às divergências quanto
ao modelo de socialismo, acabou provocando o rompimento entre a União Soviética
e a China, em 1965. Como conseqüência, Moscou retirou todos os assessores e
técnicos soviéticos que mantinha na China, agravando ainda mais os problemas
econômicos desta. O rompimento sino-soviético abriu caminho para a aproximação
sino-americana, iniciada com a viagem do presidente dos Estados Unidos, Richard
Nixon, à China, em 1972. Foi nessa época que a República Popular da China foi
admitida na ONU, em substituição a Taiwan*, tornando-se membro permanente
do Conselho de Segurança.
Com a morte de Mao Tse-tung, em
1976, ascendeu ao poder Deng Xiaoping. O novo líder pôs fim à Revolução
Cultural e iniciou um processo de desmaoização na China. Uma nova revolução
estava por acontecer.
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